Heráclito (535-475 a.C.) foi um filósofo grego pré-socrático que viveu na cidade de Éfeso e que trouxe contribuições importantes para o pensamento contemporâneo, tendo sido um dos grandes influenciadores do trabalho do filósofo francês Edgar Morin (1921-), célebre pensador, pai da Teoria da Complexidade.
Morin (2014) reflete
sobre a maneira como Heráclito funda a noção de dialética, séculos e séculos
antes de Hegel ou Marx pisarem na face da Terra: para o pré-socrático “pólemos”
(palavra grega que representa “guerra” ou “discórdia”) era a força criadora de
tudo o que existe, ou seja, existem forças antagônicas na realidade que geram
conflitos e que é através destes que o que existe se forma.
Se pensarmos bem,
desde a criação do universo no Big Bang a realidade tem existido através de uma
constante tensão entre forças antagônicas: força forte e força fraca, luz e
trevas, bem e mal, positivo e negativo, dentro e fora, esquerda e direita,
norte e sul, objetividade e subjetividade, vida e morte, amor e ódio. Essa
tensão existente entre os dois polos é GERADORA, ou seja, para que as coisas
existam é necessário que haja vibrações, perturbações, irregularidades e
desordens, caso contrário, o mundo não existiria, porque uma harmonia absoluta
é a condenação do universo. Como assim? Vivemos e existimos porque as coisas se
movem – respiração é movimento, a palpitação do coração é movimento, crescer é
um movimento, se relacionar é movimento, ou seja, tudo o que existe se move. É
impossível ter um movimento contínuo, um perfeito movimento infinito, sendo que
desta forma, as coisas tendem a se desgastar, as energias tendem a se dissipar,
à dispersão, e por isso, é impossível conservar algo em estado de perfeita
harmonia.
Desta maneira, os
desgastes, os atritos, os conflitos são parte integrante da natureza, seja ela
física, química, bio ou psicológica. Sendo assim, um desgaste gera uma reação
em cadeia que pode, em seu resultado, dar origem a outro tipo de movimento com
consequências imprevisíveis. Essa conversa que parece ser muito física é
bastante visível na psicologia: quantas vezes uma pessoa tinha em mente fazer X
mas as pessoas ao verem esta fazendo tal ação interpretaram como Y, e tudo se
deu mal?! Esse é o resultado de um conceito de que Morin (2014) chama de
Ecologia da Ação, ao entender que uma ação ganha vida social a partir do
momento em que é executada, pois a comunidade passa a lhe atribuir diferentes
sentidos.
Desta maneira, uma
das maiores contribuições de Morin (2014) feitas com base no pensamento de
Heráclito para a psicologia é a noção de Contradição Criadora/Conflito
Originário: nem sempre as situações contraditórios em que o sujeito se encontra
são ruins no processo terapêutico, muito pelo contrário, parecem representar
grandes portas para saída de dificuldades, pois é através das contradições que
existe espaço para a criatividade, e esta geralmente é o processo através do
qual o sujeito alcança sua liberdade e autonomia na psicoterapia.
Por isto, não se deve
fugir das contradições, pelo contrário, o terapeuta deve buscá-las, abraçá-las,
evidenciá-las em todo o processo, pois é esta capacidade de “chocar” o sujeito
em suas contradições que o permite sair de seu estado “sonambúlico” que o impede
de ser consciente nas/das ações que este realiza.
Desta forma, esteja
atento às contradições do discurso, do corpo, da história do sujeito, elas te
podem revelar profundas chaves que abrem portas para caminhos muito
promissores.
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Referência
Morin, E. (2014).
Meus filósofos (2ª Ed.) (E. A. Carvalho & M. P. Bosco, Trads). Porto
Alegre: Sulina.
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Imagem:
Extraída do Google Imagens
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Murillo Rodrigues
dos Santos
Psicólogo (CRP
09/9447) graduado pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (Brasil), com
formação em terapia de casais e famílias pela Universidad Católica del Norte
(Chile). Possui aperfeiçoamento profissional pela Brown University (Estados
Unidos) e Fundación Botín (Espanha). Mestre em Psicologia pela Universidade
Federal de Goiás (Brasil). Presidente da Rede Goiana de Psicologia.
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